FUNÇÕES E GRÁFICOS - GENERALIDADES. FUNÇÕES POLINOMIAIS. FUNÇÃO MÓDULO

13-03-2010 10:06

Esta é a segunda materia leccionada. Tens aqui uma breve demonstracao do que se trata o tema:

Este tema tem um ênfase muito grande na ligação entre as fórmulas e as representações geométricas. Esta ligação é muito importante para todos os que utilizarem a Matemática. A capacidade de as relacionar é uma capacidade fundamental para o mundo de hoje e do futuro e assim este tema deverá fornecer uma formação para a vida toda tão básica como a tabuada. Desejamos apenas que os programas venham a traduzir esta ideia.

Nos pré-requisitos é afirmado: "Os alunos devem conhecer a função afim; devem poder reconhecer essa função através do gráfico, esboçar o gráfico e devem conhecer algumas propriedades (monotonia e zeros de forma apenas intuitiva e usando os conhecimentos de equações)''. Que significa conhecer os zeros de forma apenas intuitiva? Os zeros de uma função afim, que é da forma f(x)=ax+b , são calculados (quando existem) de maneira evidente ao nível considerado, até porque, ainda nos pré-requisitos, é dito: "Os alunos devem saber resolver equações e inequações do 1º grau e resolver equações do 2º grau''; o que significa conhecê-los de forma apenas intuitiva? Pensamos que o texto dos pré-requisitos deve ser reformulado.

Concordamos com o primeiro ponto do "Desenvolvimento'', onde de estabelece que se deve estudar o "Gráfico cartesiano de uma função em referencial ortogonal'' ; no segundo ponto, "Definição de função, gráfico e representação gráfica de uma função'' , concordamos que deve ser apresentado a definição de função, com um mínimo de rigor, considerando, por exemplo, a ideia de correspondência entre dois conjuntos como um termo primitivo. Assim, uma função f, de A com valores em B, é uma correspondência que associa cada $x\in A$ a um e só um $y = f(x) \in B$. Como esta definição, ou outra com o mesmo grau de dificuldade, pode ser de difícil compreensão, há que rodeá-la dos cuidados indispensáveis. Além disso, convém estarmos precavidos para não confundir uma definição com uma ideia intuitiva. Como nos textos em análise é frequentemente recomendado que se deve apelar mais às ideias intuitivas do que às definições, somos levados a acreditar que neste caso se está a estabelegcer a confusão referida. Se assim for, trata-se de uma situação inaceitável; há que distinguir entre o que está formalmente correcto e o que, devido ao nível de ensino em questão, não está, pelo que é indispensável que as questões técnicas sejam escritas nas brochuras com uma linguagem correcta.

O terceiro ponto do "Desenvolvimento'' é extremamente importante, embora continuemos a ter dúvidas no significado da frase "estudo intuitivo tanto a partir de um gráfico particular como usando calculadora gráfica de propriedades das funções e dos seus gráficos''. Deve insistir-se no estudo de famílias de funções, para os casos previstos: funções quadráticas e função módulo.

Os pontos quatro a oito do "Desenvolvimento'', com os quais de um modo geral estamos de acordo, são de grande importância. Os alunos devem ficar a saber resolver inequações do 2º grau e a relacionar a resolução algébrica com a representação gráfica dos polinómios do segundo grau. A decomposição de polinómios em factores também deve ser bastante treinada. Em todo este estudo deve haver um equilíbrio entre parte algébrica, parte gráfica sem calculadora e parte gráfica com calculadora gráfica. Um excesso no uso de calculadora gráfica só serve para cair num facilitismo que mais tarde terá custos elevados.

O ponto nove do "Desenvolvimento'' - "Estudo de transformações simples de funções'' ­ deveria, pela sua importância, ser tratado mais cedo, por exemplo logo a seguir ao estudo dos polinómios do 2º grau.

Também o ponto dez, "Resolução de problemas concretos envolvendo funções polinomiais'', deve ser tratado desde o início do estudo dos polinómios, como vem aliás explicitado no primeiro parágrafo das "Indicações Metodológicas".

O último ponto da secção "Desenvolvimento" intitula-se "Estudo intuitivo de curvas que se ajustem a um conjunto de dados"; nas "Indicações Metodológicas" diz-se "O estudo de curvas deve ser feito de modo informal, experimentando o aluno qual dos tipos de funções já estudadas melhor se ajusta (poderá ser analisada a soma dos desvios ou a soma do quadrado dos desvios)". Não pensamos que o ajustamento de curvas, pela sua delicadeza, deva ser matéria do 10º ano de escolaridade; quanto a um estudo intuitivo de um tal ajustamento não entendemos o que é. Nas "Indicações Metodológicas", é certo, a noção de estudo intuitivo (que aí passou a ser informal) é esclarecida: "poderá ser analisada a soma dos desvios ou a soma dos quadrados dos desvios". Tecnicamente a soma dos desvios é irrelevante; quando muito pode ter-se em conta a soma dos módulos dos desvios (no plano (x, y) a soma dos desvios de qualquer função da forma $x\mapsto ax$ em relação aos pontos (-1,0), (0,0) e (1,0) é zero). Parece-nos no entanto um tema que só mais tarde deveria ser tratado; de qualquer forma, a ser tratado, há que corrigir os erros técnicos do documento.

No segundo parágrafo das "Indicações Metodológicas" é dito "Com vista a facilitar o uso de uma linguagem rigorosa (mas não formalista) o professor pode introduzir os conceitos de 'condição' e 'proposição' e referir sumariamente ao longo do tema as propriedades da conjunção, disjunção, negação e implicação" (foi esquecida a equivalência!). Para além de termos dúvidas do que será uma "linguagem rigorosa não formalista", o uso de uma linguagem rigorosa é condição prévia para se fazer Matemática. Contrariamente a outras áreas de conhecimento em que os conceitos podem ter alguma fluidez (por exemplo, a discussão se uma cianobactéria é uma planta ou uma bactéria só existe porque os conceitos de "planta" e "bactéria" não estão rigidamente definidos), na Matemática há que ter conceitos rigorosos que só podem ser transmitidos por via de uma linguagem rigorosa. Para a construção dessa linguagem são indispensáveis alguns rudimentos de Lógica Matemática que deveriam constar do programa e não estar, na melhor das hipóteses, vergonhosamente escondidos no meio de outras matérias. Repare-se que, na brochura, está escrito "o professor poderá ..."; provavelmente também poderá omitir os conceitos lógicos referidos que, na perspectiva da brochura, apenas servem para "facilitar" o uso da linguagem rigorosa. Na nossa opinião não é para facilitar: é para tornar a linguagem rigorosa. Os conceitos elementares de Lógica Matemática deveriam fazer parte do programa: designações, proposições, expressões com variáveis, operações com proposições (negação, conjunção, disjunção, implicação, equivalência) e quantificadores. É um assunto indispensável (mas que também pode ser divertido!) para o rigor de linguagem necessário. Na mesma ordem de ideias, uma breve referência aos conjuntos deveria constar do programa, bem como a tradução em termos de conjuntos das operações lógicas.

Como comentário ao terceiro parágrafo das "Indicações Metodológicas", onde é afirmado que "Os alunos devem sempre traçar um número apreciável de funções tanto manualmente em papel quadriculado ou papel milimétrico ... , diriamos que não deve ser dada uma ênfase especial ao traçado "rigoroso" dos gráficos; certamente que é útil ter um gráfico o mais rigoroso possível, mas, para um estudo qualitativo, é muitas vezes mais importante ter um esboço do gráfico, sem grandes preocupações de escala. É preferível que o gráfico da função $x \mapsto x^2$ seja uma curva semelhante a uma parábola nuns eixos sem escala do que uma série de pequenos segmentos rectos que unem pontos rigorosamente indicados numa folha de papel milimétrico. O parágrafo 4 das "Indicações Metodológicas" é notável (no mau sentido). Começa-se por afirmar "Todas as funções devem estar definidas apenas em intervalos (normalmente abertos); podem ser referidas ainda funções definidas por dois ou mais ramos (cujo domínio é um intervalo ou união de intervalos)". Esta proposição, em que o que vem depois do ponto e vírgula contradiz o que vem antes, lembra-nos as redacções de matemáticos (muitos dos quais importantes) do princípio do século; o exemplo mais caricato é o do livro onde, depois de provado um teorema (em que faltavam algumas hipóteses) são apresentados exemplos de excepções ao teorema! Estamos a chegar ao século XXI e já não são admitidas proposições deste tipo. Concordamos que o domínio das funções estudadas deva ser relativamente simples, mas os intervalos não bastam (nem sequer para a proporcionalidade inversa $x \mapsto 1/x$ ). E porquê apenas intervalos abertos? (deitamos ao lixo $x \mapsto \sqrt{x}$ ?). As uniões finitas de intervalos disjuntos também não chegam, a menos que evitemos $x \mapsto \tan x$. Não seria mais aconselhável utilizar uma linguagem mais simples e apenas exprimir a seguinte ideia do senso comum (não matemática): "não compliquem demasiado os domínios das funções". Seja como for, o objectivo deve ser o da determinação do domínio da expressão analítica que define a função (supondo evidentemente que a função só é definida por uma expressão analítica), embora a função possa ser restringida a um certo subdomínio. Quando a função for definida por duas (ou mais) expressões analíticas proceder-se-ía de forma semelhante. Também nos parece estranha a frase seguinte da brochura: "Dificuldade a não exceder nas funções definidas por dois ou mais ramos:

\begin{displaymath}f(r)=\left\vert r-a\right\vert, \qquad g(x)=\left\vert x-3\ri...
...0$}\\ x^2-5x &
\mbox{se $x\leq 0$}\end{array}\right..\mbox{''}\end{displaymath}


Para além de considerarmos curiosa a utilização da variável independente r para a função f e de x para as funções g e h e de se utilizar o termo "ramos" em vez de "expressões analíticas", o que significa não exceder a dificuldade de h? Será que,

 

\begin{displaymath}x \mapsto \left\{\begin{array}{ll}3x^2-5 & \mbox{se $x>0$}\\ x^2-5x &
\mbox{se $x\leq 0$}\end{array}\right.\end{displaymath}


é mais difícil do que h? Poder-se-á estudar h e não esta última função? Para além do caricato da frase anterior é triste que, num programa do Ensino Secundário, a limitação na matéria seja feita por cima. Em vez de se dizer que os alunos têm, pelo menos, de saber estudar isto ou aquilo, diz-se que os alunos podem, no máximo, estudar isto ou aquilo! Todo o programa está, infelizmente, impregnado desta filosofia. O parágrafo seguinte da brochura é igualmente pouco esclarecedor: "No estudo de famílias de funções os alunos podem realizar pequenas investigações". Que quer isto dizer? Nada! Estudar uma família de funções é, já por si, um pequeno trabalho de investigação. Que outras investigações se podem fazer? Quererão os autores referir alguma interligação com a vida real, aparecendo a família de funções como modelação de um problema concreto? Estamos de acordo. Mas, nesse caso, não há que distinguir a família de funções de uma única função. Porquê só realizar pequenas investigações no caso das famílias de funções? Nos parágrafos seis a onze das "Indicações Metodológicas" fazem-se considerações diversas sobre representações gráficas. Repetimos o que já dissemos anteriormente; a calculadora gráfica (ou o computador) é uma excelente ajuda no estudo das representações gráficas de funções. Não é mais do que isso: é uma ajuda. Um exagero na sua utilização é tão maléfico como a sua abolição do ensino. Ao desenharmos os gráficos de $x \mapsto x^2$ e $x\mapsto x^4$ numa calculadora gráfica obtemos duas curvas de forma aparentemente semelhante; não é a calculadora que nos vai dizer que a primeira é uma parábola e a segunda não. 

 


 

Voltar

Procurar no site

© 2010 Todos os direitos reservados.